A garganta arranha. Sede. Ela senta-se na cama, o lençol deliza deixando àmostra sua nudez. Assim que levantasse ele acordaria, ela sabia. Já não tinha vergonha da nudez que ele provocou, que ela cedeu sem pudor. Não há pudor entre eles, não mais. Enquanto havia era doce. Agora são corpos sedentos pela sensação que nenhum outro corpo daria. Ela havia tentado, sabe que ele também. Não iria comparar com drogas, embora igual fosse.
Olhou para os braços por um momento, tantas cicatrizes... Esse é um novo aspecto da relação. Parece doentil a qualquer outro, para eles é um ato de cumplicidade extrema. No momento que ela puxa a lâmina pelo antebraço, de modo não mortal, é observada. Para então observá-lo aproximar-se sorrateiro, subindo a língua pelo corte. A dor não era nada perto do vazio sentido em seu peito, porém a carícia que suga seu sangue a conforta. Talvez eles sejarm merecedores de si.
A garganta arranha. Sede e choro. Levanta-se e vai até a mesa perto da porta, enche o pequeno copo de sakê e toma de uma vez. Desiste do copo e entorna a garrafa. Poucos goles até sentir uma mão em sua cintura. A outra envolve a sua e tira o liquido do contato com a boca, pondo a garrafa sobre a mesa. As costas aquecem-se; é envolvida num abraço. Um sussurro em seu ouvido:
-Seu coração é inalcansável.
-E o seu inexistente.
-Me pergunto se fui eu quem a matou.
-Você apenas encontrou-me em estado de putrefação, agora já não existo.
-Gostaria de ter vindo primeiro.
-Eu não estaria aqui. Ele teve que fazer.
-Preferiria você viva à comigo.
-Então sente amor a mim?
-Talvez o seja.
-Comigo não.
-Eu sei.
As lágrimas que achava ter perdido desabrocharam e cariram sobre as mãos dele. Gostaria de correspondê-lo, mas seu coração despedaçado desaprendera a amar... E ele sabe. Por que dizer esse tipo de coisa que só irá feri-la ainda mais? Se preferia ela viva por que ao menos não evitar machuca-la? Provavelmente porque ela o fere não correspondendo-o... Pode ser que somente machucados permaneçam juntos. Sente ele apertando-a com mais força contra si.
-Essas lágrimas que são por você... Desgosto.
-Também não gosto.
Ele se curva e começar a beijar-lhe o pescoço. As lágrima cessam. Ela os põe de frente. Irão se machucar um pouco mais.